segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Soneto do Amor Como Um Rio - Por Julianna Merat e Vinicius de Moraes.



Esse poema eu e Vinicius compusemos tempos atrás... lembro-me que a trilha sonora era qualquer coisa do Cab Calloway e bebericávamos uma cachaça baiana muitíssimo agradável, de mel e canela, levemente licorosa. Ele tentava convencer-me de que os Montecristos são mais palatáveis que os Gabriellas e eu tentava convencê-lo de que Bettie Page é muito mais palatáve que Helô Pinheiro.


Este infinito amor de um ano faz.



(Um ano? Não não, talvez mais. Certamente mais. Muito mais. Quem em sã consciência ama e ama tão intensamente no prazo de um único ano? Com exceção claro dos poetas, músicos, escritores, cineastas, entusiastas, cientistas e todo o resto de toda sorte de caracteres comprometidos. Ou um engenheiro ama assim? Um advogado, um parlamentar??? Não não, pessoas como eu seguem protocolos para amar. É preciso ser lógico, conciso, coerente, coeso, é preciso coexistir, compartilhar, comparar e por fim aprovar.) Sendo assim, este infinito amor de 30 anos faz.


Este amor que é maior do que o tempo e do que tudo


(Sim, mas isso é muito claro, não é? Já que tudo são brechas, falhas, lapsos, devaneios e esquecimentos do tempo, sendo o amor maior que o próprio tempo, ele é conclusivamente maior e mais grave que todo o resto.)


E que contudo eu já não cria que existisse mais.


(Mas como é possível crer em algo assim? Como poderia eu, uma mulher de ciências, crer em algo assim? Como é possível afirmar ou pressupor que algo assim exista sem qualquer premissa? Como é possível ter qualquer consciência de algo maior que o próprio tempo?)


Esse amor que surgiu insuspeitado...


(Como poderia, volto a perguntar, tal absurdo não ser insuspeitado? Como poderia ser esperado? A não ser, claro, pelos poetas e cientistas noéticos.)


... E dentro do drama fez-se em paz.


(Este sim é um grande mistério para mim. Como tanto caos pode ser capaz de me inundar assim de paz?)


Este amor que é túmulo onde jazz (“some of these days you’ll gonna miss me honey, some of these days you’ll gonna be so lonely. You’ll miss my huggin’, you’ll miss my kissin’, miss me babe when I’m far away…) meu corpo para sempre sepultado.


(E que foi alforria para minha alma e balsamo para toda crueldade do mundo e do viver)


Esse amor meu é como um rio. Um rio noturno, interminável e tardio.


(Uma pausa aqui. Avisto um vulto. Essa pausa durará até o final do soneto.)


A deslizar macio pelo ermo


E que em seu curso sideral me leva Ilumidado de paixão na treva...


Para o espaço sem fim de um mar sem termo.


(Explicação da pausa. Não foi um vulto. Nesse momento a poetisa enxerga seu amado. Então, meus caros, obviamente nada mais precisa ser explicado. O Poeta suspirou. Que me desculpem os feios, mas beleza é fundamental... ela definitivamente não concordava com isso...)

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