"Mornings are for coffee and contemplation", said once sheriff Hoper. E eu sempre concordei com o parafraseado, apesar de somente tê-lo descoberto recentemente.
Estava à completa mercê do clichê, com uma xícara fumegante de café na mão direita, cigarro na esquerda, contemplando o sentido do todo nesta Terra, quando então num lento piscar de minha terceira pálpebra, o Universo, muito didaticamente, dá-me respostas como quem dá tapas na cara. Não, too clasyfor my little existance. Como quem dá jabs no estômago. Mas as respostas mostram-se tão ricamente ilustradas, com requintes de uma luz delicada, nacarada, de beleza precisa, numa plasticidade de movimentos e crudeza de significado que o primeiro segundo de entendimento foi uma epifania fria, chocada. Epifania cartesiana.
Contra o verde que se estica em matizes não reproduzíves, um par de grandes asas azuis-céu, asas quase etéreas, sobrevoava poeticamente o meu manjericão em plena florescência. Enquanto eu cerebralmente me dividia entre por nada nesse mundo perder um segundo que fosse daquela beleza de pintura e as frenéticas sinapses apavoradas pela motefobia, um Tiê-sangue entra na indizível tela de acontecimentos. Insensível ao belo - ele mesmo signo vermelho vivo brilhante de beleza - predador assertivo, parte certeiro para a enorme borboleta azul-céu. Tudo tão, tão bonito! O balé da borboleta contra a brisa da Mantiqueira, os verdes todos ali, se esticando e misturando até um azul-verde-acinzentado das Agulhas Negras lá no alto, uma luz como que difusa por entre as brumas que já se dissipavam, uma flecha vermelho-sangue, viva e faminta, uma boca vermelha de morte. Tudo tão tão bonito!
E pela sagrada Lei da Analogia, eu entendi.
Alguém disse que somos o inferno de um outro mundo. Outro alguém disse que encontramo-nos em um orbe de expiação. Vida e morte do denso. Do ciclo. Do micro ao macro, assim na Terra como nos Céus, em todas as possibilidades da ordem a partir do caos. Mas é tudo de uma beleza!
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Para o querido leitor cético, ateu, ocupado demais com questões mais sérias, arrependido de ter lido essa crônica até o final... você tem o seu ponto. Mas eu sempre cri que a verdade está mais nítida e acessível pela manhã, talvez como o prana na atmosfera. E isso, a mim, basta.
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Ainda analiso que como um meta-episódio de uma história em quadrinhos qualquer, nós, homo sapien sapiens (aquele que 'sabe que sabe') - eu, observadora da cena incluída na própria - estamos sempre muito imersos em todas as nossas pequenezas dentro do universo insondável de nós - minha motefobia em pé-de-igualdade com minha eterna devoção ao belo - enquanto que o Todo passa ao largo, à volta, em frente...tão tão maior que nós em nossa imensa e mesquinha beleza de universo diminuto. Na distração, o que importa passa, as armadilhas famintas do ego a tudo comem e regurgitam.
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Este foi um texto de fé.